06 setembro, 2020

Dualidade.

Às vezes quero alhear-me das pessoas. Esquecer que existem, que há dezenas delas ao virar da esquina. Não que me perturbem, pois a conversa suscita em mim felicidade e entendimento. Mas eis que sinto que a minha alma, eu mesma, preciso tanto de silêncio, de estar só na minha vida e na minha própria companhia. Necessito. Quero perder-me nos meus pensamentos para conseguir encontrar um caminho. O meu caminho.
Pode soar totalmente sem sentido, uma vez que é esse um dos meus maiores receios... Estar só. 
Por vezes sinto que não me encaixo, que devia estar num outro lugar, a fazer uma outra coisa. Procuro entendimento e sentido em tudo o que vejo e sinto. Mas pensamos muito quando estamos sós. E faltam os amigos para dar leveza e humor aos dias cinzentos. O passado revisita-me, mas já me convenci a amá-lo tal como foi e a deixá-lo ficar como doce memória. Permaneço aqui. Eu mesma, com as mesmas questões, um tanto ou nada mudada, com mais umas luzes de farol para seguir. Mas penso que sempre com a mesma essência. Em busca. Em espera. Em Deus. Sempre na orla de Deus. 

01 dezembro, 2018

Não sei de mim.

Procuro-me nas veredas da vida,
Perco-me nas curvas obscuras
E às vezes não sei de mim.
Vejo caminhos ocultos que não sei reconhecer.
Entrelaço memórias e sonhos,
Sinto que estou longe de onde devia estar.

Faço pausas e revejo-me, por momentos, em espelhos acutilantes.
Quero à força o regresso de um passado meu.
Quero esconder-me em baixo das copas,
Resguardar a minha alma do que não posso controlar.
No coração a esperança e a fé,
A vontade de voltar a encontrar-me
Nas ruas perdidas onde já soube ser feliz sem pensar.

17 novembro, 2016

O que aprendi ao estagiar no Diário de Notícias?


Há uns dias vi uma fotografia que foi partilhada na rede social Facebook e que me deixou, por alguns momentos, quieta, a pensar. Essa fotografia mostra parte da redação do jornal Diário de Notícias (DN) vazia. Quando digo vazia refiro-me a um vazio material. Não há secretárias onde elas costumavam estar, faltam os computadores e os telefones... mas as pessoas ainda estão lá. Os jornalistas, a essa data, cumpriam o último fim-de-semana de trabalho naquele edíficio. Soube há algum tempo que a redação do DN iria abandonar o emblemático prédio da Avenida da Liberdade, nº 266, e mudar-se para as Torres de Lisboa, onde o espaço será partilhado com a equipa da TSF, também pertencente à Global Media Group. Fiquei um tanto ou quanto espantada com a notícia. Não duvido que possa ser o melhor em termos de interacção entre equipas e em termos de rentabilização, mas na minha visão sobre esta mudança, e porque não a vivo em primeira pessoa, as memórias falam mais alto. Sempre associei o Diário de Notícias àquele edifício. Quem não? Quanta história, quanta importância... a fachada tão característica que podia ser vista por todos quanto passavam pelo Marquês de Pombal. Confortou-me o facto de saber que os novos proprietários do edifício o vão manter o mais fiel possível, a própria referência ao nome do jornal no topo da fachada, permanecerá. Como eu digo, é história. Antes de passar ao verdadeiro propósito deste post quero, ainda, referir, outro aspecto que me chamou a atenção na dita fotografia. Reconheci poucos. Passaram-se três anos desde o meu estágio no DN e vejo que, de lá para cá, muita coisa tem mudado. Soube que o meu editor (secção de Segurança), já enveredou por outra área, o sub-director Nuno Saraiva faz hoje parte do Gabinete de Comunicação do Sporting, entre outros casos. Surpreendeu-me olhar para a fotografia e reconhecer apenas alguns jornalistas do "meu tempo". 

Feito isto, e porque são algumas as memórias que guardo do DN, nº 266 da Avenida da Liberdade, resolvi escrever acerca do que aprendi a estagiar nesta redacção. 

Por vezes, o nosso trabalho vai para o lixo. Esta frase não é minha, foi-me dita pelo meu editor, na altura. Soube o seu significado da pior forma, mas depressa percebi que é algo normal e que pode acontecer a todos, não só a jovens estagiários. Numa manhã tinha sido enviada para o Cais do Sodré, mais propriamente para a estação de comboios onde tinha ocorrido um descarrilamento que estava a provocar atrasos. O objectivo era recolher testemunhos por parte dos passageiros e até dos funcionários. Fiz o meu trabalho, voltei para a redacção e escrevi o artigo, tendo em conta o espaço que tinha disponível para ele. Estava empolgada por ver um artigo meu nas páginas do DN. Contudo, no dia seguinte, quando abro o jornal, na própria redacção, não o encontro em lado algum. Questionei o meu editor e o mesmo respondeu-me com a frase que dá início a este tópico. Simples assim. Surgiu algo mais importante, entretanto, e o meu artigo teve de "cair". Se todo o trabalho foi em vão? Teoricamente, sim, porque só eu e o meu editor é que tivemos acesso aos dados que recolhi. Na prática foi mais uma oportunidade de sair da redacção ao encontro da notícia e de me aprimorar na escrita de notícias. 

Como funciona uma redacção. Neste aspecto, eu tinha uma ideia errada acerca do ambiente nas redacções. Pensava que os jornalistas eram pessoas muito sérias, e são, no desempenho do seu trabalho, mas descobri uma redacção muito familiar, com um ambiente de trabalho convidativo, bem-disposto, de entre-ajuda. A comunicação é constante, entre nós e com o exterior. Foi bastante pedagógico assistir a debates entre jornalistas sobre o imediatismo, sobre a confirmação com as fontes, sobre o melhor título para uma dada notícia. Aprende-se muito com a observação, acreditem. Fica-se a saber imenso sobre a rotina jornalística.

A importância de conhecer as fontes. A eterna relação entre o jornalista e as fontes! É mais difícil para um estagiário construir uma relação com as fontes em comparação com um jornalista que tem mais de dez anos de casa. As fontes conquistam-se ao longo do tempo através de confiança e da isenção do nosso trabalho. É muito importante saber que fontes contactar tendo em conta a natureza do acontecimento. Procurar fontes credíveis, saber confrontar os dois lados de uma história. Esta é a conjugação de uma notícia, se assim não for ela acabará por ter um carácter tendencioso. 

Há falsos alarmes. Um dia, tinham recebido de um leitor a informação de que havia um grande incêndio em Telheiras, um bairro de Lisboa. Segundo o leitor, haveria muito fumo e muita gente no local. A minha função era ligar para os Bombeiros Sapadores de Lisboa para confirmar a notícia e saber mais pormenores sobre o dito incêndio. Feito o contacto com os bombeiros, a resposta do outro lado foi de que não havia incêndio nenhum, nem em Telheiras, nem em Lisboa. Aqui está, a importância de confirmar a informação.

A enfrentar um desafio sozinha. Duas semanas antes do meu estágio terminar recebi um grande desafio: escrever um artigo sobre o uso indevido do telemóvel na condução. Esse artigo tinha uma data para estar pronto e eu comecei logo a trabalhar nele. Seleccionei as fontes que achei pertinentes, entre as quais a Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (ANSR), a GNR, a PSP, bem como o presidente da Prevenção Rodoviária Portuguesa e a Associação de Cidadãos Automobilizados. Tive de esperar alguns dias para receber dados estatísticos por parte da ANSR e, entretanto, o meu editor ausentou-se da redacção durante três dias. Eu já tinha bastante informação, mas precisava de orientações, precisava de saber se estava a abordar o tema como devia, se a notícia tinha um fio condutor. Mas, de facto, eu não podia parar, mesmo sem ter um feedback, até porque o prazo de entrega já estava próximo. Então, decidi ir para a rua e falar com pessoas, condutores, ao mesmo tempo em que compilava algumas informações que estariam nas caixas adicionais da notícia. Resultado: correu tudo bem. O meu artigo foi aprovado pelo editor, foi publicado com o meu nome, ocupou a primeira página do jornal e ainda serviu de alavanca para que a notícia fosse divulgada, também, pelos jornais televisivos. Foi uma grande vitória pessoal e guardo essa edição do jornal religiosamente até hoje. Mesmo com contratempos, é possível. Muitas vezes é um teste à nossa capacidade de enfrentar as situações.


Conclusão. Durante os três meses enquanto aprendiz e estagiária no Diário de Notícias senti a satisfação que é sair da redacção para o terreno, aprendi a evitar chavões como “ilícitos criminais”, consegui “puxar” o que é notícia logo para o primeiro parágrafo do texto e tornou-se ainda mais claro que tudo o que se escreve em jornalismo deve ser sustentado por fontes credíveis e não por ideias do senso comum. 
Percebi que o jornalismo me preenche e me faz sentir realizada; que não há horários para os jornalistas; que o trabalho, na maior parte das vezes, é árduo; que as fontes são essenciais para todo e qualquer trabalho e que é necessário escolhê-las bem; que apesar de todos os condicionalismos da profissão há quase sempre o cuidado de cumprir o código deontológico. 
Apesar da redacção do DN ser um espelho da actualidade e todo o trabalho ser fruto de contactos com o exterior, eu considero a redacção como um mundo à parte. Um mundo onde os esforços se concentram no serviço público, onde a prioridade é informar com qualidade e “em tempo útil”. A redação é um mundo que eu tive a satisfação, não só de conhecer, como de pertencer durante três meses, e que abriu de uma forma espantosa os meus horizontes e a minha perspectiva sobre a profissão de jornalista. 

Fotografias: www.dn.pt